Gabriel Jansen no X-Alps: Superação, Treinamento Intenso e o Orgulho de Voar pelo Brasil!
Entrevistamos o Gabriel sobre sua preparação para o X-Alps
A sondagem atmosférica, feita através do lançamento de balões meteorológicos, é considerada o “padrão ouro” na avaliação climática. A partir da sondagem é obtido um gráfico, o Tefigrama ou Skew-T, que indica o comportamento do ar. O gráfico é o resultado dos dados colhidos pelos instrumentos a bordo do balão à medida em que ele sobe, sendo estes dados a temperatura ambiente, a temperatura do ponto de orvalho, densidade do ar, velocidade e direção do vento. Saber avaliar o gráfico da sondagem é simples e deve ser do conhecimento de todo o piloto de Voo Livre.
Após os dados terem sido processados e plotados na forma de um gráfico, tem-se uma fotografia da atmosfera do solo até o limite superior da troposfera, tirada duas vezes ao dia a partir do lançamento dos balões, que ocorre nos principais aeroportos do país, às 9 horas da manhã e às 21 horas (00 e 12 UTC). A abrangência da sondagem é um raio de cerca de 50 km a partir do local de lançamento.
O gráfico é plotado sobre uma matriz de constantes, sendo elas a temperatura (isoterma), a pressão atmosférica (isóbara), a adiabática seca, a adiabática úmida e a saturação adiabática. De todas estas constantes, a que devemos nos atentar é a adiabática seca, como veremos. Cabe salientar que as linhas isotérmicas sobem do eixo das abcissas de maneira inclinada para a direita, daí a denominação de “Skew-T” do gráfico, uma vez que skew pode ser traduzido para o português como “inclinado".
Abaixo, a representação da matriz do Tefigrama com suas constantes, onde as curvas de temperatura ambiente e do ponto de orvalho serão plotadas:
MATRIZ DO TEFIGRAMA
O que ocorre na prática é o lançamento do balão que contém os instrumentos que sondam o ar, um rádio transmissor (daí o procedimento também ser conhecido como “rádio sondagem”) e um GPS. Os dados transmitidos são processados por um supercomputador no Departamento de Ciências Atmosféricas da Universidade do Wyoming. O resultado é expresso na forma de duas linhas plotadas sobre a matriz do tefigrama: uma linha à esquerda, que é a curva da temperatura do ponto de orvalho, e uma linha à direita, que é a curva da temperatura ambiente.
Sabendo-se que o ponto de orvalho é a temperatura na qual o vapor d’água se condensa, quando a temperatura ambiente é próxima da temperatura do ponto de orvalho ocorre a formação de nuvem.
Com a interpretação do gráfico resultante da sondagem podemos saber como o ar se comporta em termos da estabilidade ou instabilidade do clima, da formação ou não de nuvens, da base das nuvens, da potência das térmicas, da ocorrência de inversões térmicas, da direção e intensidade do vento nas várias camadas e do risco de superdesenvolvimento.
Portanto, a primeira coisa que devemos verificar é se as linhas das temperaturas plotadas estão próximas uma da outra e a que altitude isso se dá, uma vez que indica a ocorrência de nuvens, sendo que podemos avaliar os tipos de nuvens em função da altitude em que ocorrem.
A próxima avaliação a ser feita é a inclinação dos vários segmentos da linha à direita, a da temperatura ambiente. Sabemos que uma térmica, ou "parcela de ar”, continuará a subir enquanto permanecer mais quente que o ar ao seu redor. E também sabemos que a razão adiabática seca é de 1°C/100m, ou seja, o ar esfria 1 grau a cada 100 metros que sobe.
Assim, uma parcela de ar que esfria à medida que sobe na mesma razão de 1° a cada 100 metros irá subir sem perder calor para o ar vizinho. Portanto, o cenário ideal é que o segmento da curva da temperatura ambiente (a da direita no gráfico), em nosso nível de voo, esteja paralela à linha da adiabática seca. Esta condição é chamada pelos meteorologistas como “condicionalmente instável”.
Por outro lado, quando um segmento da curva da temperatura ambiente aparece inclinada para a direita à medida em que se eleva na atmosfera, indica que a parcela de ar se aqueceu ao subir, o que é o inverso que se espera pela razão adiabática, caracterizando assim uma “inversão térmica”.
Um segmento da curva da temperatura ambiente que esteja praticamente na vertical indica ar estável. Quando muito inclinada para a esquerda, mais inclinada que a linha da adiabática seca, os meteorologistas dizem que o ar é instável. São estas as inclinações dos seguimentos da curva da temperatura ambiente e suas denominações:
Para se acessar o gráfico é necessário percorrer um caminho no site http://weather.uwyo.edu/upperair/sounding.html. Na opção "Region", escolha South America; na opção "Type of plot”, escolha GIF: Skew-T; e clique no mapa sobre o local mais próximo de sua rampa, que no meu caso esta sob o número 83566 (Confins). Vale salientar que as leituras mais adequadas ao nosso horário de voo são publicadas diariamente, por volta das 10:30h, após o lançamento que ocorre às 9 horas. Para obter esta informação, o gráfico escolhido deve ser do horário de 12Z (12 horas Zulu) no dia atual no alto da página, tanto em “From", quanto em “To".
Vejamos um exemplo real de uma sondagem atmosférica:
Neste gráfico acima, obtido da sondagem de um balão lançado em Brasília no dia 19/08/2017 às 9 horas (12 Zulu), vemos a linha da temperatura do ponto de orvalho à esquerda e a linha da temperatura ambiente à direita.
Vemos também que as linhas não se aproximam de modo significativo, o que denota a existência de poucas nuvens, condição típica de Brasília em agosto.
Observa-se, também, que um segmento da curva da temperatura ambiente, entre 1.500m (850hPa) e aproximadamente 3.000m (700hPa), encontra-se exatamente paralela à linha da razão adiabática seca, nosso melhor cenário possível.
Na publicação do gráfico, também se tem uma coluna de barbelas indicando a direção e intensidade do vento nas várias camadas, sendo que barbela com um traço representa 10 nós (cerca de 20k/h) e a ponta da barbela indica a altitude registrada, e a sua inclinação indica a direção do vento. Variações na direção e intensidade do vento em camadas vizinhas indicam a presença de cisalhamento horizontal e, portanto, turbulência.
Na coluna mais à direita encontra-se uma série de parâmetros e índices meteorológicos que nos são úteis. Dos mais importantes destaco o LCLP, que é a pressão atmosférica do nível de condensação, que indica a que altitude está a base da nuvem.
Outros parâmetros que devemos observar são os indicadores de tempestades severas, sendo eles o LIFT e o CAPE. Valores de LIFT negativos, associados a CAPE acima de 500, apontam para o superdesenvolvimento de nuvens.
Na figura abaixo vemos destacadas as informações já descritas:
Neste mesmo dia, foi registrado este voo partindo da rampa do Paranã:
Como se vê, os dados da sondagem apontando para uma condição ideal de térmicas, com teto na casa de 3.000 m, ventos moderados de nordeste e sem superdesenvolvimento foram confirmados na prática.
Há que se considerar algumas questões envolvendo a sondagem atmosférica, a fim de entendermos suas limitações. O maior problema está na escassez de lançamento dos balões, deixando este serviço no Brasil restrito apenas aos grandes centros, sendo eles: Boa Vista, Macapá, Manaus, Porto Velho, Alta Floresta, Belém, Santarém, Natal, Vilhena, Brasília, Uberlândia, Corumbá, Confins (BH), Vitória, Rio de Janeiro, Campo de Marte (SP), Foz do Iguaçu, Curitiba, Florianópolis e Porto Alegre.
Outra questão é o fato da sondagem ser uma fotografia da atmosfera obtida às 9 horas da manhã. Sendo assim, devemos estimar a evolução do dia de acordo com o comportamento do ar registrado naquele horário. Significa que pequenas inversões térmicas indicadas no gráfico podem se quebrar, desde que não exija um grande aquecimento para que se rompa e que a inclinação da curva da temperatura ambiente esteja paralela à linha da adiabática seca abaixo e acima da inversão.
Outro viés que ocorre está na área coberta pela sondagem. Quanto mais distante do local de lançamento estiver o sítio de voo, menor será a acuracidade da sondagem. Assim, devemos ter a sondagem como uma referência, desde que esteja dentro da área de abrangência, mas também devemos avaliar localmente a condição, considerando as peculiaridades do relevo, além da presença e o desenvolvimento das nuvens.
Cabe salientar que gráficos de sondagens publicados em sites de previsão de modo prospectivo, com dias de antecedência, não são, na verdade, sondagens feitas por balões e, sim, uma projeção do que seria uma sondagem, considerando os dados de um modelo de previsão meteorológica. A sondagem real é usada como uma das três fontes que alimentam os modelos prognósticos, sendo os dados das estações e as imagens de satélites as outras duas. Quando se publica uma sondagem para um dia futuro, o processo é inverso, usando-se um modelo prognóstico para se estimar o que seria a sondagem para aquele dia. Esta informação, assim processada, carece de valor.
Com o hábito de se avaliar diariamente o gráfico da sondagem atmosférica, nos tornamos aptos a fazer uma leitura instantânea do seu significado, apenas olhando o quão próximo as curvas das temperaturas estão uma da outra, as inclinações dos segmentos da curva da temperatura ambiente que informa sobre o comportamento das térmicas, a direção e intensidade do vento nas várias camadas, a altitude da base da nuvem e os índices de superdesenvolvimento. No fim do dia, uma avaliação retrospectiva de como o dia se desenrolou nos ajuda a consolidar as informações fornecidas por esta importante ferramenta de prospecção do clima.